Aprontei-me para a tua chegada. Comprei o vestido mais caro de uma loja chiquíssima. Comprei batom, verniz e perfume. Já não sabia o que era ser mulher. Vivi fora do presente durante demasiado tempo. Fui engolida por uma baleia e deixei de ver com nitidez. A lucidez abandonou-me. Os navios rasgavam o oceano, eu ouvia-os, mas não sabia como tocar neles. Os meus olhos não ultrapassavam a barreira. É o momento de me pôr bela. Vejo as crianças que brincam na rua com um sorriso. Falo com os vizinhos, dão-me os parabéns por ter ressurgido das trevas. Se eu era o navio e tu o capitão, não fazia sentido ir ao fundo sozinha. Fico ansiosa. Que palavras te direi? Sou muito tímida, especialmente, na tua companhia. A teu lado, sou uma rapariguinha, não abro a boca, coro com facilidade. Ensinaste-me tudo. Antes de apareceres, era uma saloia, não sabia nada. Pegava em livros para adormecer. Aprendi a ler na tua cama. Os teus livros agarraram-se-me para sempre aos dedos. Não foi apenas isso. Cresci. Dizias: «Respeita-te.» E eu respeitei-me. Ensinaste-me a ver o pôr-do-sol. Sei captar a beleza de uma tarde chuvosa. Antes de ti, não havia amor. Agora, dou lições sobre a matéria. Primeira lição: comprar muitos lenços. Segunda lição: chorar. Terceira lição: a relação não depende de mim. Quarta lição: as doses de sofrimento são equivalentes às de alegria. Quinta lição: é preciso saber esperar. Sexta lição: no corpo mais saudável esconde-se a doença. A lagarta esconde-se dentro da maçã vermelha. O beijo traz uma ferroada.